Exposição no Solar da Beira em Belém: Itinerância da 34ª Bienal de São Paulo chega a Belém (PA). Vale Música participou da abertura
Belém (PA) recebe uma exposição da 34ª Bienal de São Paulo – Faz escuro mas eu canto, com abertura ontem, dia 29 setembro, no Solar da Beira. A exposição segue até 20 de novembro na cidade, e foi viabilizada através do apoio cultural da CODEM – Companhia de Desenvolvimento da Área Metropolitana, Prefeitura de Belém, bem como da SECON – Secretaria Municipal de Economia e da FUMBEL – Fundação Cultural do Município de Belém. O evento de abertura no dia 29, às 10h, contará com apresentação gratuita do Grupo de Percussão de Câmara Vale Música, mantido pelo Instituto Cultural Vale em Belém.
Para 2022, as mostras itinerantes da 34ª Bienal de São Paulo foram concebidas a partir de enunciados, que são objetos ou elementos imateriais com histórias marcantes ao redor dos quais obras e artistas são reunidos, estimulando leituras a partir de narrativas e não de formulações conceituais fechadas. A visitação é gratuita.
Em Belém, a exposição é organizada a partir de dois enunciados – A imagem gravada de Coatlicue e Hiroshima mon amour de Alain Resnais –, ao redor dos quais agrupam-se obras que dialogam com questões como alteridade e opacidade – sendo este último um conceito do autor Édouard Glissant, uma das referências teóricas desta edição da mostra.
A mostra é composta por trabalhos de 9 artistas de 8 diferentes países: Alice Shintani (Brasil), Claude Cahun (França), Gala Porras-Kim (Colômbia), Haris Epaminonda (Chipre), Jungjin Lee (Coreia do Sul), Melvin Moti (Holanda), Naomi Rincón Gallardo (Estados Unidos), Uýra (Brasil) e Marinella Senatore (Itália).
No Mercado Ver-o-Peso, o público poderá ver a escultura de luz Nos erguemos ao levantar outras pessoas (2021), obra da artista italiana Marinella Senatore, especialmente produzida para a 34ª Bienal de São Paulo. A instalação de 10 metros de diâmetro ficará suspensa sobre os transeuntes, próxima ao telhado do Mercado, criando uma arquitetura efêmera e impactante. Composta por dezenas de lâmpadas, a obra nos lembra da força das ações realizadas coletivamente.
Evento de abertura
O Grupo de Percussão de Câmara Vale Música fez uma apresentação especial na abertura da exposição. Formado por onze alunos do Projeto Vale Música Belém, o grupo traz os ritmos regionais para os visitantes da exposição e dá as boas-vindas a Bienal de São Paulo. O repertório da apresentação é composto por sete obras que traduzem a diversidade cultural do estado, com composições de artistas regionais consagrados como Dona Onete, Pinduca, Lia Sophia, Verequete, Gonzaga Blantez e Teddy Max.
Sobre o enunciado A imagem gravada de Coatlicue
Em 13 de agosto de 1790, um grupo de trabalhadores que fazia escavações na Praça Central da Cidade do México descobriu uma estátua, retratada e identificada pelo astrônomo e antropólogo Antonio de León y Gama como Teoyaomiqui. Na verdade, era a deusa Coatlicue, também conhecida como Dama de la Falda de Serpientes [Senhora da saia de serpentes]. Na mitologia asteca, Coatlicue, padroeira da vida e da morte, era a mãe de Huitzilopochtli, deus da terra, e representava a fertilidade. A descoberta ocorreu durante as obras de construção de um canal de água para abastecer a cidade colonial, erguida sobre a grande Tenochtitlán, antiga capital asteca. Em 1520, quando as hordas espanholas lideradas por Hernán Cortez entraram na cidade, gradualmente subjugando e aniquilando uma das urbes mais prósperas de toda a Mesoamérica, dentre as estratégias utilizadas para desmantelar o império asteca esteve a eliminação de seus símbolos e crenças através da invisibilização e da substituição de imagens e tradições antigas.
O vice-rei Revillagigedo ordenou que Coatlicue fosse levada para a Universidade Real e Pontifícia do México como uma relíquia do passado mesoamericano. Mas, depois de algumas deliberações, as autoridades espanholas decidiram enterrá-la novamente, suspeitando que a senhora da saia de serpentes pudesse desencadear uma revolução. Enterraram-na sob o claustro da universidade, até que, em 1804, um curioso Alexander von Humboldt pediu para vê-la durante sua visita à Nova Espanha. As crônicas narram que o explorador alemão começou a desenhá-la sem, no entanto, completar a ilustração: os religiosos da universidade tornaram a escondê-la sob a terra, talvez temendo que seu poder se tornasse incontrolável, e Humboldt teve que soltar as rédeas de sua imaginação para imortalizar a aura poderosa de Coatlicue em seus esboços.
Sobre o enunciado Hiroshima mon amour de Alain Resnais
O que há, de fato, para ver e para entender naquilo que sobrevive às tragédias, aos extermínios de populações e culturas? Diante do trauma inenarrável, o que podem contar um museu, um monumento, uma ruína ou uma cicatriz? “As reconstruções, por falta de outra coisa”, “As explicações, por falta de outra coisa”, “As fotografias, por falta de outra coisa”, diz Ela, a protagonista (francesa) de Hiroshima mon amour, o clássico dirigido por Alain Resnais em 1959, na sequência inicial do filme. Ela se refere ao que encontrou em Hiroshima quase quinze anos após o bombardeamento que vitimou mais de 160 mil pessoas, mas poderia estar falando também daquilo que é encontrado por quem visita os campos de concentração nazistas, ou mesmo os museus repletos de despojos da colonização. Mas os objetos, as fotografias, as explicações, as reconstruções não são suficientes para entender. Hiroshima mon amour não busca explicar, nem reconstruir, mas apalpar a opacidade e a intraduzibilidade do testemunho.
Como Ela, às vezes nos esforçamos por entender, procuramos nos aproximar de todas as formas possíveis, por todos os ângulos: lemos as explicações, visitamos os destroços, olhamos de novo cada fotografia velha. Mas é impossível conhecer Hiroshima, como é impossível compreender outros atos de extrema violência de que é feita nossa história. Nunca poderemos sentir a temperatura do sol sobre a Praça da Paz, mas podemos tentar nos aproximar do indizível, tentar dar forma àquilo que não pode ter nome. A arte é, também, um desses caminhos pelos quais se busca cercar o incompreensível, não o reduzir a explicações, mas dar-lhe contorno, desenhar o alcance daquilo que irradia. Porque a tradução, embora impossível, é, ainda assim, necessária; porque nesse esforço falido aprendemos sobre nossos desejos e medos – o medo que dá não saber, não chegar a entender, ou o medo de nos sabermos capazes de atos que nunca poderemos compreender.
Sobre o Programa de mostras itinerantes da Bienal de São Paulo
O Programa de mostras itinerantes da Bienal de São Paulo é uma iniciativa que chega em 2022 à sua sexta edição. A itinerância da 33ª Bienal, em 2019, percorreu oito cidades, sendo uma no exterior, e recebeu um público de mais de 170 mil visitantes.
“O programa aposta na arte e no seu impacto positivo no campo da educação e da cidadania. Parcerias com as instituições em cada local permitem a difusão do trabalho para além do circuito artístico da cidade de São Paulo, chegando a outros olhares e novas sensibilidades. Além das exposições, a iniciativa inclui ações educativas e de difusão, estando alinhada à missão da Fundação de integrar cultura e educação à vida cotidiana”, afirma José Olympio da Veiga Pereira, presidente da Fundação Bienal.
Pela iniciativa, além de São Luís (MA), Campinas (SP), São José do Rio Preto (SP), Campos do Jordão (SP), Belo Horizonte (BH), Fortaleza (CE) e Belém (PA), outras cidades brasileiras e do exterior irão receber recortes da 34ª Bienal este ano: Brasília (DF), Rio de Janeiro (RJ), Santiago (Chile) e Arles (França).
Serviço
34ª Bienal de São Paulo – Faz escuro mas eu canto
Programa de mostras itinerantes
Belém (PA)
Solar da Beira
Blvd. Castilhos França, 120 – Campina
Até 20 de novembro de 2022
terça – sexta, 8h – 17h
sábado – domingo, 8h – 14h
Entrada gratuita
Abertura
Apresentação do Grupo de Percussão de Câmara Vale Música
Fonte: Fundação Bienal de São Paulo