Os efeitos da dependência química no cérebro de quem é dependente. Leia o que diz o psicólogo Franco Cruz
Pesquisas da Organização Mundial de Saúde (OMS) comprovam que cerca de 6% da população brasileira têm algum tipo de dependência química, o que equivale a aproximadamente 12,4 milhões de pessoas. A dependência química é uma condição de adoecimento do cérebro no qual uma pessoa frente ao uso de substâncias psicoativas (legais e ilegais) passa a apresentar uma série de prejuízos nas esferas física, emocional e social, e nos âmbitos profissional e familiar. Ou seja, é um sofrimento de ordem compulsiva que assume um lugar central na vida do indivíduo.
Para o psicólogo Franco Cruz, da clínica Voo de Liberdade, diferentes elementos incidem no sujeito que se encontra nesta posição. “Encontramos pessoas em uma condição de predisposição, nas quais um pequeno contato com a substância já apresenta um desdobramento compulsivo e autodestrutivo agudo. Enquanto outras realizam um uso inicialmente controlado dos psicoativos, contudo, gradualmente, avançam chegando em um grau de maior compulsão, que por conseguinte apresenta mais riscos de sequelas devido o uso prolongado”, explicou.
As drogas, de acordo com o especialista, provocam uma hiperestimulação em áreas cerebrais responsáveis pela geração de prazer e de relaxamento, bem como a modificação na química geral do cérebro, tornando a pessoa dependente. “Contudo, é fundamental entender o sujeito em sua totalidade biopsicossocial. Os desafios da modernidade, pressões no âmbito social, estratégias para lidar com a realidade e com desafios e angústias são base para entender a dinâmica da dependência na vida de alguém”, destacou Franco.
A reação inicial de prazer possibilitada pela droga faz com que o dependente químico entre em um ciclo de compulsão para manutenção do uso. As consequências são acompanhadas de ansiedade, perda de peso, problemas cardíacos, tremores, cirrose, hepatite, ou situações de emergência como crises de convulsão. Podem gerar também infartos e acidente vascular cerebral devido ao uso excessivo e prolongado, perda da coordenação motora, da memória e da atenção, perda cognitiva, do raciocínio lógico, da capacidade empática e afetiva. Esses efeitos podem provocar o uso contínuo da droga, a ansiedade, a depressão ou a síndrome do pânico, bem como outros transtornos mentais (demência precoce e crises de esquizofrenia).
“Tendo em vista o caráter multifatorial do adoecimento, o tratamento precisa ser desenvolvido em diferentes níveis e abordagens. O sujeito precisa ser fisicamente retirado do contato e mesmo da possibilidade de contato com a substância, pois, com a abstinência, ele poderá ser capaz de realizar o que for preciso para consegui-la. Existem medicações que auxiliam nas crises de ansiedade, depressivas e mesmo psicóticas da abstinência. A psicoterapia é fundamental para que o sujeito simbolize a função exercida pela droga na sua organização psíquica e gradativamente desenvolva habilidades sociais e inteligência emocional que o auxiliem a reorganizar suas práticas cotidianas”, pontuou o psicólogo.
Outra dimensão estratégica no tratamento é a participação dos familiares, para que entendam sobre a doença e possam tomar medidas práticas de reorganização na dinâmica familiar, pautadas na saúde mental de seus integrantes e nas particularidades que a pessoa em tratamento demandará.
O tratamento deve ocorrer de maneira contínua, com reavaliações periódicas e manutenção das estratégias para evitar situações de gatilho, e assim possíveis recaídas. “Dependendo do tipo de substância, tempo de uso e comorbidade desenvolvida pela pessoa, como por exemplo, demência alcoólica, a pessoa poderá apresentar sequelas não totalmente reversíveis. Todavia, a maioria das pessoas que passam por um tratamento intensivo para dependência química apresentam potencialidade para superar prejuízos decorrentes dessa condição”, disse Franco.
André Sousa, 32, paciente em recuperação, está sem usar drogas há aproximadamente nove anos, após ser dependente desde os 13 anos. “Com o passar do tempo, o meu problema com as drogas só ia agravando e eu não percebia, eu pensei que não tinha nada. Aos 19 anos, comecei a me envolver com o crime organizado e aos 22 fui preso, e continuava achando que isso não tinha nada a ver com as drogas. Nada do que acontecia comigo eu relacionava às drogas, já que eu pensava que elas me faziam bem. Aos 23 anos, depois de vários surtos, minha família me internou, no dia 20 de janeiro de 2013”, relembrou.
Dois meses após sua internação, André percebeu que não precisava de drogas para ser feliz. “Eu reaprendi a viver. Não sabia quando tinha sido a última vez que eu tinha me sentido tão bem sem usar drogas. Eu era uma pessoa indiferente de tudo e que não acreditava que poderia parar de usar drogas, mas agora vejo que o tratamento funciona de verdade, pois estou conseguindo me manter ‘limpo’ há muitos anos. Hoje eu me vejo como uma pessoa modificada, evoluída. Espero que essa mensagem chegue a quem esteja realmente precisando no momento”, afirmou André.
Fonte: NM Comunicação&marketing
Por Ana Luiza Ibelloni
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